Terror de baixo custo espalha o medo no mundo

Publiciado em 19/08/2017 as 17:41

Os recentes ataques como os de Barcelona e Cambrils, o de Turku, na Finlândia, que deixaram pelo menos 16 mortos e mais de cem feridos têm, em sua essência, estratégias fáceis de organizar, quase impossíveis de impedir, sem sofisticação, e o mais sugestivo para os extremistas: causam grande impacto midiático, com uma relação custo-benefício extraordinária. Vistos como um "terrorismo de baixo custo", esses ataques têm sido praticados há tempos pelas redes "jihadistas". 

Primeiramente, pela Al-Qaeda, a partir do 11 de setembro de 2001. E, na última década, com regularidade, pelo Estado Islâmico.

Para especialistas, frente a essa estratégia terrorista, que tem toda Europa como alvo, é necessário se preparar para uma confrontação de longo prazo e apostar na resiliência das sociedades democráticas. No momento em que todas as capitais e grandes cidades turísticas do continente investem em dispositivos fixos para conter veículos que possam ser usados como armas, após os ataques dessa natureza cometidos em Nice, Berlim, Londres e Estocolmo, nada mais fácil do que contorná-los. E assim foi feito em Barcelona, assim foi em Cambrils, na última quinta-feira. 

"É o princípio dos alvos fáceis", explica Frédéric Gallois, ex-diretor do Grupo de Intervenção da Gendarmeria Nacional, o GIGN. "Qualquer aglomeração de civis é um. E concentrações de multidão. Há milhares", acrescenta.

"Os terroristas vão, na medida do possível, visar a alvos fáceis, que tenham o máximo de conotação simbólica, como a Champs Élysées, as Ramblas. Mas, se esses lugares forem objeto de proteção, como começou a ser o caso, eles sempre vão encontrar uma rua adjacente para atacar (...) Em Roma, se você não puder se aproximar da Praça São Pedro, mas se você tiver matado dez pessoas em uma rua próxima, você terá atacado Roma e o Vaticano. A carga simbólica será a mesma", alega.

"Sejam regulares"
Com o objetivo de esgotar o inimigo pouco a pouco na impossibilidade de atacá-lo frontalmente, essa estratégia dos "mil cortes" coloca a ação terrorista ao alcance de todos: agentes adormecidos, ou infiltrados, que se tornaram aguerridos na Síria, ou no Iraque; simpatizantes que se radicalizaram; ou mesmo pessoas com problemas mentais que possam ser, eventualmente, estimuladas à ação por um clima dessa natureza. De Paris a Barcelona, passando por Berlim e Nice, os terroristas por trás dos atropelamentos em massa cometidos nos últimos meses na Europa agiram todos com poucos meios, com alto grau de radicalização, mas sem vínculos com a cúpula do EI.

"O Estado Islâmico disse a essas pessoas: 'usem o que vocês tiverem à mão, um carro, uma faca, uma pedra'. Isso multiplica sua capacidade de agir. Nenhum treinamento é necessário, alvos de proximidade e de oportunidade, e pronto. De um ponto de vista terrorista, a relação custo-benefício é imbatível", avalia Gallois. Desde então, terroristas inspirados e motivados pelo EI, normalmente sem vínculo direto com a organização, têm cometido atentados - ou pelo menos tentado - dessa forma em várias cidades europeias.

"Eles não buscam mais a intensidade da ação, com meios espetaculares, mas a frequência, para tentar estabilizar a força visada. É essa regularidade que faz mal. As instruções são as seguintes: 'inscrevam-se no tempo e sejam regulares'. Hoje, são de quatro a seis semanas entre cada atentado na Europa. Ao fim desse período de tempo, todos nós nos dizemos: vai acontecer alguma coisa", acrescenta.

Resistência e longo prazo

Para o pesquisador Jean-Pierre Filiu, professor na Sciences Po Paris, o EI obedece a sua própria lógica e tem objetivos de longo prazo. "É uma questão de oportunidade em seu planejamento terrorista", disse ele ao France Inter na última sexta-feira.

"Eles querem mostrar que continuam sendo muito eficazes, apesar dos recuos no terreno. Mas não é por causa dos recuos no Iraque e na Síria que eles atacam", apontou. Diante dessa ameaça, impossível de impedir completamente em um futuro próximo e até passível de aumentar com o retorno de centenas de extremistas da Síria e do Iraque, o papel das autoridades deve ser preparar as democracias europeias para resistir.

"É preciso evitar a demagogia", convocou, em recente declaração, a senadora francesa Nathalie Goulet, copresidente da comissão de investigação sobre a luta contra as "redes jihadistas". "Nem toda a Inteligência do mundo impedirá esse tipo de ataque", segundo ela.

"É preciso enfrentar a realidade. É uma mentira fazer as pessoas acreditarem que vamos resolver o problema banindo os muçulmanos, ou fechando as mesquitas. Pelo contrário, isso alimentaria o argumento do Estado Islâmico", advertiu.

"Um indivíduo que pega seu carro, atropela pessoas… É necessário, infelizmente, que a gente aprenda a viver com isso e que cada cidadão seja vigilante", completou a senadora.