João Daniel apresenta projeto que trata sobre quebra de patentes, para que vacinação chegue mais rápido aos brasileiros

Publiciado em 03/05/2021 as 15:00

O Brasil tem visto, diariamente, a dificuldade em vacinar a população contra a Covid-19. Menos de 20% já foi vacinada. O país vive agora a realidade da escassez, em muitos estados, de vacina para aplicar a segunda dose do imunizante, correndo o risco da perda do prazo que garanta a imunização completa dessas pessoas já vacinadas. Para possibilitar que haja a produção de vacinas no Brasil, num período muito menor de tempo, o deputado federal João Daniel (PT/SE) apresentou o projeto de lei 160/2021 que trata sobre a quebra de patentes para a produção de vacinas.

A propositura propõe que seja suspensa parte das obrigações do Estado Brasileiro de efetivar ou aderir ao Acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (ADPIC) – Agreement on TradeRelated Aspects of Intellectual Property Rights (TRIPS) –, praticados pelo Conselho Geral da Organização Mundial do Comércio, enquanto no mínimo 80% da população brasileira não estiver imunizada contra a Covid-19. O PL propõe em seu artigo 2º que, enquanto não alcançado esse percentual de vacinação, “os titulares das patentes licenciadas ou pedido de patentes relativos a vacinas e/ou medicamentos relacionados à prevenção, controle ou tratamento da Covid-19, definidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), e pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), deverão disponibilizar ao poder público todas as informações para reprodução dos objetos patenteados, devendo o poder público garantir a proteção dessas informações contra a concorrência desleal e práticas comerciais desonestas, podendo tornar nula a patente ou o registro já concedidos ou em exame da autoridade competente.

João Daniel destacou no projeto que, em outubro do ano passado, a Índia e a África do Sul levaram à Organização Mundial do Comércio (OMC) uma proposta de suspensão das patentes de produtos de combate ao novo coronavírus. A proposta foi apoiada por mais de 100 países. A ideia seria facilitar a produção de vacinas por países pobres e garantir que bilhões de pessoas tenham acesso ao imunizante no mesmo ritmo das populações mais ricas. Hoje, as principais vacinas contra a Covid-19 pertencem a laboratórios americanos, europeus e chineses, embora algumas delas tenham sido em parte financiadas pelo poder público e por filantropos.

Acelerar vacinação

O deputado argumenta que a quebra de patentes, vista como uma forma de acelerar a vacinação no país, é prevista pela lei de propriedade industrial brasileira (9.279/1996), no Direito Internacional, e no artigo 71 da Lei de Patentes brasileira, além de ter efeito imediato autorizado pelo decreto 3.201/99, da Presidência da República. As atuais regras de propriedade intelectual foram formuladas na OMC em 1994: são os chamados Trips, na sigla em inglês. O acordo foi defendido pelos Estados Unidos e outros países ricos, e uniformizou uma série de normas sobre patentes que todos os membros da OMC devem seguir para participar do órgão. Uma delas estipula um limite mínimo de 20 anos para uma patente de medicamento vencer, por exemplo. Os Trips foram uma imposição dos países ricos para proteger suas patentes e manter o capital de maneira hegemônica.

O parlamentar ressaltou que o licenciamento compulsório – uma medida prevista na legislação brasileira – apenas suspende temporariamente o direito de exclusividade - ou monopólio - do titular de uma patente. “Em outras palavras, no caso em questão, os fabricantes de vacinas ou de outras tecnologias de combate à Covid-19 somente abririam mão do direito exclusivo de produzir e vender determinada vacina ou tecnologia, permitindo que outros laboratórios também a fabricassem e a vendessem enquanto durasse a emergência de saúde, mas continuariam a receber royalties”, explicou.

João Daniel acrescentou que a possibilidade de emitir licenças compulsórias em casos de emergência também consta de diversos acordos e tratados internacionais. Centenas de países e personalidades estão hoje mobilizados para acionar esse dispositivo no âmbito da Organização Mundial do Comércio, por exemplo, para permitir que a vacina chegue a todas e todos o quanto antes. “A aprovação desse projeto permitiria que muito mais vacinas fossem produzidas num período muito menor de tempo, reduzindo a disseminação do vírus e muitas mortes evitáveis”, disse.

“Mas, apesar da previsão em lei, a licença compulsória só foi utilizada uma vez no Brasil, em 2006. O governo Lula decretou a quebra da patente do Efavirenz, do laboratório Merck Sharp&Dohme, usado no tratamento da Aids. A medida resultou na redução de 72% no preço pago pelo remédio. Brasil pode alegar que a pandemia de Covid-19 se trata de uma emergência sanitária e que há grande interesse público de que as vacinas fiquem mais baratas para serem aplicadas em toda a população de maneira mais rápida”, disse o parlamentar.

Ele lembra que diversas entidades da área da saúde e pesquisadores cobraram um posicionamento do Brasil sobre o assunto, que vem sendo debatido tanto na OMC quanto na Organização Mundial da Saúde (OMS). Para especialistas em saúde pública, a licença compulsória diminuiria a escassez de vacinas no mundo por acabar, mesmo que momentaneamente, com o monopólio na produção dos imunizantes.

“Esse nosso projeto de lei prevê a licença compulsória de vacinas e medicamentos para o enfrentamento à Covid-19, obrigando os titulares das patentes a ceder ao poder público todas as informações de imunizantes ou medicamentos já licenciados pela Anvisa ou com pedidos de patente pendentes de análise pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial”, explica João Daniel.

Catástrofe humanitária

A Covid-19 já causou a morte de mais de 407 mil pessoas e quase 15 milhões de pessoas infectadas pelo novo coronavírus. O mês de abril, o mais grave e letal no país desde o início da pandemia, teve recorde no número diário de mortes, ultrapassado a marca de 4 mil óbitos por dia. “É inegável que a pandemia da Covid-19 no Brasil já se tornou uma catástrofe humanitária. Mas, em vez de trabalhar para que medidas sanitárias comprovadamente eficazes sejam adotadas, o governo brasileiro, com apoio do Congresso, tem agido de forma a piorar as chances de seus cidadãos sobreviverem à pandemia”, lamentou o deputado.

Para ele, a maneira pela qual o governo vem conduzindo a resposta à pandemia tem intensificado as desigualdades no país, sejam socioeconômicas, raciais, de gênero e territoriais. Grupos cujos direitos têm sido historicamente violados, tais como a população negra, quilombola e indígena, são os que detêm hoje maior índice de mortalidade por Covid-19. O mesmo acontece com aqueles vivendo na extrema pobreza, particularmente as mulheres negras e aqueles que integram serviços considerados essenciais. “A vacina, que poderia diminuir a vulnerabilidade a qual estão expostas essas populações, tampouco está disponível para elas. Além disso, o Plano Nacional de Imunização tem deixado fora da prioridade grupos com alta possibilidade de contágio e complicações mortais pelo vírus, tais como pessoas em situação de rua, quilombolas, trabalhadores de serviços essenciais e pessoas em situação de privação de liberdade”, observou.

De acordo com o deputado, a pandemia é um desafio global. “Somente na esfera pública, que conta com o SUS e os sistemas de seguridade e proteção social, é possível garantir que o direito constitucional à saúde seja cumprido na prática de forma equitativa, universal e redistributiva. Toda a população tem direito de ser vacinada, e isso só será possível por meio do Sistema Único de Saúde”, frisou João Daniel.

 
 
 

Da Assessoria