Rejeição da emenda das Diretas Já completa 40 anos

Movimento que reivindicava eleições diretas para presidente da República, após o fim da ditadura militar, fortaleceu a luta pela redemocratização do Brasil e motivou a realização de uma nova Constituição

Publiciado em 27/04/2024 as 10:00
Acervo EBC/Agência Brasil

Há 40 anos, na madrugada do dia 26 de abril de 1984, o plenário da Câmara dos Deputados rejeitou a emenda constitucional que restabelecia as eleições diretas para os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República a partir de 1985. Dos 479 deputados com mandato daquela época, 298 votaram a favor da emenda, 65 foram contra, três se abstiveram e outros 113 se ausentaram. Com esse resultado, a chamada Emenda Dante de Oliveira, assim chamada em homenagem ao então deputado federal que apresentou a proposta, não atingia o mínimo de 320 votos, exigido na época para aprovação e encaminhamento ao Senado.


O resultado daquela sessão frustrou a expectativa de milhões de brasileiros, que estavam mobilizados desde março de 1983 em uma grande campanha nacional: a das “Diretas Já”, que reivindicava mudanças sociais e econômicas, liberdade política e o direito de a população escolher livremente o seu chefe de estado. Ao longo de um ano, comícios e passeatas levaram multidões às praças e avenidas das capitais e das grandes cidades brasileiras, com a presença de líderes políticos da oposição na época, como Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Leonel Brizola, Franco Montoro, Miguel Arraes, Fernando Henrique Cardoso e o atual presidente Luís Inácio Lula da Silva.


O professor Maurício Gentil Monteiro, do curso de Direito da Universidade Tiradentes (Unit), explica que a Diretas Já foi um amplo movimento popular no contexto do processo de reabertura política e transição democrática, que marcou o fim do governo João Figueiredo (1979-1985). “O próprio governo militar começa a distensionar, os apoios internacionais começam a enfraquecer e há um movimento operário ascendente e contestando. A oposição consentida do MDB começa a ganhar mais força e vários políticos que tinham sido exilados voltam ao país. É nesse contexto que os segmentos democráticos da sociedade começam a se organizar para uma ampla campanha em prol das Diretas, para que pudesse o povo voltar a eleger diretamente o seu presidente da República. E foi uma campanha com participação efetiva e maciça da população”, diz ele.


Ainda de acordo com Maurício, a derrota da emenda das Diretas “não arrefeceu a luta da Cidadania em prol da redemocratização”, mas fortaleceu outras lutas políticas travadas naquele momento. A primeira foi o fim da escolha de militares para o cargo de presidente, o que já aconteceu nas eleições indiretas de janeiro de 1985. O professor define que houve “um esforço da cidadania em tentar eleger o primeiro presidente civil desde 1964”, o que levou o PMDB e outros partidos, incluindo a Frente Liberal formada por dissidentes do PDS, a formar a Aliança Democrática, coalizão que indicou e que elegeu a chapa de Tancredo Neves e José Sarney, com mais de 300 votos de diferença.


A segunda luta, tida como uma das mais importantes no período, foi a substituição da Constituição de 1967, elaborada durante a ditadura, por uma nova, formulada por deputados e senadores eleitos pelo povo. “O acúmulo da mobilização popular em prol das Diretas já serviu para o acúmulo seguinte, que foi a campanha pela convocação de uma Assembleia Constituinte. Ela veio efetivamente promulgar uma nova Constituição que estabelecesse novamente o regime democrático no país”, diz Gentil. A assembleia foi convocada em 1986, sob a presidência de José Sarney, que assumiu o governo em definitivo após a morte de Tancredo, em 21 de abril de 1985.


As eleições diretas para presidente viriam em 1989, um ano depois da promulgação da atual Constituição, e de lá pra cá, se repetiram oito vezes, formando o maior ciclo democrático desde 1946. Para o professor da Unit, a campanha das Diretas Já deixou lições importantes de mobilização social, “que posteriormente foi utilizada em diversas outras situações da cidadania brasileira por reivindicações democráticas das mais variadas, dentro uma sociedade plural e complexa, e na qual efetivamente o povo seja titular da soberania, tal como determina a Constituição”.


Autor: Gabriel Damásio

Fonte: Asscom Unit